“Que horas ela volta?” O nome do filme indicado para representar o Brasil no Oscar tem um “erro de português”? Na língua culta, é evidente que sim. A gramática formal exigiria preposição: “A que horas ela volta”. Só que partir daí para dizer com ares alarmistas que o filme deixa o Brasil “mal na foto” – como fez neste artigo a jornalista Dad Squarisi, veterana colunista de português dos Diários Associados – é, este sim, um equívoco constrangedor. Revela visão curta sobre como a língua funciona.
O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. “Que ano você nasceu”, “Que série você estuda?” e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros, mesmo os de alto grau de escolaridade. Falantes educados sabem – sem precisar pensar nisso – em que situações pega bem ou pega mal usá-las. Será preciso reafirmar a esta altura do século 21 que obras de arte têm liberdade para “transgressões” muito maiores?
Pretender que o título de um longa-metragem de ficção tenha obrigatoriamente o mesmo grau de formalidade de um editorial de jornal ou relatório de firma revela um jeito carrancudo e autoritário de compreender o funcionamento não só da língua, mas da arte também. Imagine (I can’t get no) Satisfaction, a famosa canção dos Rolling Stones, sendo corrigida pelo revisor da gravadora: “No, Mick, you CANNOT get ANY satisfaction”. E o que seria feito de “No meio do caminho tinha uma pedra”, o maravilhoso verso “errado” do Drummond?
Aiaiai, né?
E eu aqui, na minha cruzada pró representação decente da oralidade brasileira, que tinha ficado pensando que quase seria mais recomendável que o filme se chamasse “que HORA ela volta?”
🙂
Excelente sugestão, maestro!
Neste texto também há erros!
Lembre-se que não devemos separar sujeito e verbo com vírgulas.
Bebeu, Anônimo? Cada uma. Não há nada parecido com isso no texto.
(A propósito, convém deixar claro que comentários anônimos não mais serão aceitos aqui, regra básica da casa. Nome e email válido são essenciais. Dessa vez passa.)
As observações de Sérgio Rodrigues são perfeitas, irretocáveis.
“O título do filme, tirado da fala de um personagem, está em registro coloquial. “Que ano você nasceu”, “Que série você estuda?” e frases do gênero são familiares a todos os brasileiros,”.
Outros exemplos: “Que horas o trem chega?”, “Que horas você chegou ontem?”.
Alguém acredita que Dad Squarisi nunca usou frases desse tipo?
Sem contar que a referida fala é atribuída a uma criança, conforme relata a filha da personagem principal ao contar para a mãe que, por estar tão distante dela, vivia perguntando: que horas ela volta?
Verdade, Wanir. Nem precisava, mas reforça o argumento.
Parabéns!
Olá, Sérgio.
Ótimo post! Parabéns pelo blog, gostei muito.
Sou revisora de textos e sempre me deparo com questões como essa.
Aproveito para convidá-lo a conhecer meu blog, Português sem Mistério, em que publico dicas de português: http://portuguessemmisterio.com.br/
Abraço,
Betty
Olá, Betty. Muito obrigado e seja bem-vinda. Prometo aparecer em breve na sua casa virtual para uma visita! Um abraço e boa sorte para nós.
Não importa se o povo fala ou não assim. O título continua errado. Se é uma fala de personagem, então que se coloque a pergunta entre aspas. E não há nada de maravilhoso no verso errado do Drummond. Aliás, Drummond era péssimo!
Hahaha, é isso aí, Eduardo!